quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Pelo fim do coronelismo eletrônico

Começa hoje - daqui a pouco!! - a Conferência Livre de Comunicação da UnB, organizada pelo DCE em parceria com diversos outros grupos da universidade. Confira aqui a programação, e participe!

Aproveitamos para divulgar o manifesto "Pelo fim do coronelismo eletrônico", elaborado pelo Intervozes e subscrito há alguns meses pelo DCE, Gestão Pra Fazer Diferente.

Pra conferir por si próprio a lastimável situação de controle coronelista da comunicação no Brasil, conheça os dados apresentados pelo portal Donos da Mídia. Veja também (aqui) estudo da década de oitenta que mostra como em três anos e meio José Sarney e ACM (quando José Sarney era Presidente da República, e Antônio Carlos Magalhães, Ministro das Comunicações) deram mais concessões de rádio e TV do que em todas as décadas anteriores somadas, como maneira nada republicana de reforçar clientelisticamente o próprio poder.

Pelo fim do coronelismo eletrônico
Manifesto contra a outorga de concessões de rádio e TV a deputados e senadores

No início do mês de abril, recomendação aprovada pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado Federal recolocou em pauta a questão sobre se deputados e senadores podem ou não ser proprietários de emissoras concessionárias de rádio e TV. A recomendação diz expressamente que não é lícito a esses parlamentares figurarem como diretores, proprietários ou controladores de empresas que explorem serviços de radiodifusão; e acrescenta que, caso verificada essa condição, o respectivo ato de outorga ou renovação deverá ser rejeitado.

Ainda que dependa de aprovação no plenário daquela casa, a recomendação reforça a compreensão de que o artigo 54 da Constituição Federal proíbe os parlamentares de serem donos de empresas concessionárias. De fato, o texto constitucional diz que deputados e senadores não poderão, desde a expedição do diploma, “firmar ou manter contrato com pessoa jurídica de direito público, autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista ou empresa concessionária de serviço público, salvo quando o contrato obedecer a cláusulas uniformes” e, desde a posse, “ser proprietários, controladores ou diretores de empresa que goze de favor decorrente de contrato com pessoas jurídicas de direito público, ou nela exercer função remunerada”. Ora, é difícil interpretar que esses termos não proíbam a propriedade de concessionárias de rádio e TV por parlamentares.

Contudo, essa norma tem sido continuamente desrespeitada, e hoje cerca de 25% dos senadores e 10% dos deputados federais são concessionários de rádio e TV – sem contar aqueles que têm empresas em nome de familiares ou laranjas. Essa realidade fere dois princípios democráticos: o primeiro, da separação entre os poderes. Claramente, a posse de meios de comunicação por parlamentares significa um acúmulo de poder inaceitável em uma democracia, que acaba funcionando como um círculo vicioso reforçador de poder. Essa separação existe entre os três poderes tradicionais, e não deve ser diferente em relação ao “quarto poder”.

O segundo é o fato de, neste caso, os concessionários serem também concedentes (o artigo 223 estabelece que a concessão ou permissão só tem validade depois de aprovada pelo Congresso Nacional), o que gera um inevitável conflito de interesses. De fato, estudo recente do Laboratório de Políticas de Comunicação da Universidade de Brasília revelou que 37,5% dos membros titulares da Comissão de Ciência, Tecnologia, Comunicação e Informática (CCTCI) da Câmara e 47% dos titulares da Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática do Senado, responsáveis pela análise dos processos de outorgas, são proprietários de emissoras de rádio e TV ou têm familiares controladores destes tipos de veículos de comunicação.

Se não bastassem esses dois motivos, a história ainda mostra que, em diversos momentos, concessões dadas pelo Ministério das Comunicações a parlamentares foram usadas como moeda de troca política. A votação dos 5 anos para Sarney e a aprovação da emenda da reeleição durante o governo Fernando Henrique Cardoso são exemplos clássicos de episódios em que se comprovou essa relação. No início deste ano de 2009, outro episódio envolvendo o ex-presidente Sarney comprovou o uso político das concessões de rádio e TV, acrescentando outro problema aos já listados. Computados todos os prejuízos, não há por que a democracia brasileira continuar convivendo com essa aberração.

Parte dos parlamentares, percebendo os danos causado à democracia, tem tomado iniciativas importantes para combater essa realidade. Além da recomendação aprovada na CCJ do Senado, em dezembro de 2008 foi aprovado relatório da subcomissão que discutia a questão das concessões de rádio e TV na Câmara dos Deputados. O relatório constatou a má aplicação do artigo 54 e, a fim de evitar questões de interpretação, lançou, entre outras medidas, uma Proposta de Emenda à Constituição que acrescenta ao artigo 222 o seguinte parágrafo: “Não poderá ser proprietário, controlador, gerente ou diretor de empresa de radiodifusão sonora e de sons e imagens quem esteja investido em cargo público ou no gozo de imunidade parlamentar ou de foro especial”. Sua aprovação ajudaria a dirimir os efeitos negativos da possibilidade de má interpretação do artigo 54. Igualmente importante seria coibir a propriedade também por parentes em 1° e 2° graus dos políticos, já que neste caso configura-se a posse por um mesmo grupo familiar.

Independentemente da forma de coibir esse abuso, o Brasil não pode mais dar suporte a uma prática que reforça a concentração de poder e estabelece distorções no Parlamento. Na busca do aperfeiçoamento das instituições e do consequente aprimoramento da democracia, defendemos o fim do ‘coronelismo eletrônico’ e queremos:

- aprovação em plenário da recomendação da CCJ do Senado que aponta a ilicitude da propriedade de emissoras concessionárias por parlamentares;
- aprovação da PEC proposta pela subcomissão de outorgas da Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática da Câmara dos Deputados, que estabelece textualmente a proibição de que parlamentares ou ocupantes de cargos públicos sejam proprietários de empresas de rádio e TV;
- proibição explícita do uso de concessões de rádio e TV para fins políticos e punição rigorosa nos casos em que se identificar essa prática, com perda do mandato de parlamentares envolvidos.

Brasília, 5 de maio de 2009




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